quarta-feira, 9 de novembro de 2016

Quando a abstenção se transforma em mudança


Donald Trump é, definitivamente, o homem do momento.

Venceu, e isso é que será escrito na história. O nome dele será para sempre, gravado como um dos Presidentes da maior potência mundial.

Independentemente de se concordo ou não com o meio que atingiu o seu objetivo, a verdade é que o atingiu, e isso é uma proeza incrível.

Durante os últimos dias, algumas sondagens davam Trump como vencedor. Ainda ontem, quando escrevi este artigo, previa-se uma vitória de Hillary Clinton.

Sabíamos que haviam Estados cruciais, onde se ela vencesse, a noite acabaria cedo. Florida foi só o primeiro sinal. Durante a noite, e já perto das 3 horas da manhã, postei no facebook aquele que era o ponto de situação. Publiquei como estavam as contagens de voto nos então Estados cruciais do momento, eram Flórida, Ohio e Carolina do Norte. Em todos, e já com mais de 50% dos votos contados em todos eles, Trump ia na frente. Mais, na Florida estava quase quase fechado e era quase certa a vitória dele.

Hoje, muitos estão a perguntar como é que é possível ele ter vencido, tendo dito as atrocidades que disse. Mas a explicação não é assim tão complexa e não está só ao alcance de alguns politólogos, não, pelo contrário.

Aproveito para dizer que ainda ontem, durante a tarde e mesmo ao início da noite, acreditava que ela ganharia por uma margem muito pequena, mas que venceria. Enganei-me, como se pode ver, e como muita gente se enganou.

O que fez Trump vencer foi, essencialmente, o voto dos “brancos pouco qualificados”, foi assim que foi apresentado nos media o principal eleitorado de Trump. Ora, e quem são estes eleitores? São todos aqueles que estão desiludidos com o sistema, com a democracia, os mais vulneráveis às crises económicas, aqueles que perdem emprego com muita facilidade, aqueles que, por andarem desiludidos, não iam votar com tanta regularidade e por isso eram pouco “estudados”. Estas eleições tiveram, ao que parece, uma afluência histórica às urnas, o que quer dizer que o discurso de Trump foi exatamente ao encontro de todos aqueles que apenas nos cafés demonstravam descontentamento. Desta vez, saíram de casa, e deram-lhe a vitória.

Outro fator que pode, a meu ver, explicar a vitória dele, é que quando se parte para uma eleição com o objetivo de se ser o mal menor, a coisa não corre bem. E foi o que aconteceu a Hillary. Vejamos quantos discursos ela fez dizendo algo como: Ele diz isto e aquilo, é este o Presidente que querem? Então votem em mim. Ora, essa estratégia nitidamente já não cola, não cola porque o eleitor é exigente, quer propostas e quer visão. Certa ou errada, e estou sempre a falar aos meus olhos, a verdade é que ele teve uma estratégia clara: fazer da América grande, outra vez. E a forma que ele encontrou de se aproximar dos votos que precisava, foi contestar o sistema. Feitas as contas, os que contestam o sistema, são mais dos que os que o defendem, ou então de outra forma, os que contestam estão mais dispostos a contestar do que os que o defendem estão dispostos a defender.

A lição, talvez mais importante, é que os sistemas têm de se renovar. Não podem ser sempre mais do mesmo, e que tal algo mais inclusivo? Pode ser boa ideia.

E agora uma questão: Quantos Trump estavam a espera da vitória do primeiro Trump? Confuso? Explico. Temos assistido nos últimos anos a um crescimento, tímido, das extrema direita nos países ocidentais. Porquê: Porque não se revêm no sistema e estão fartas. São as pessoas que se abstêm. Quando se diz que a abstenção é o maior adversário da democracia, é por isto mesmo, é que um dia não são mais a abstenção, são a mudança. Donald Trump pode ser só a ponta do iceberg, e isso é que pode ser assustador.

Porém, e virando agora o bico ao prego, até porque gosto de ver o copo sempre meio cheio, agrada-me a ideia que volta e meia me vem a cabeça de que Donald Trump é um grande estratega, e como estratega que é, aplicou o marketing político ao mais alto nível e que, afinal, será um Presidente com algumas notas positivas. Esta minha crença não assenta apenas no copo meio cheio, mas também pode ser fundamentada numa declaração do próprio, em 1998 em que diz algo como: Se algum dia se candidatasse, candidatar-se-ia pelos republicanos porque estes eram o maior grupo eleitor de totós, porque acreditavam em qualquer coisa da Fox News, ele poderia mentir e eles aceitariam. E assim foi. Quase 20 anos depois, concorreu, pelos republicanos, mentiu, e a Fox News acompanhou a noite em que ele se tornou o novo Presidente.

Se nada do que acima escrevi for válido, faço all in na ideia, com a qual não concordo mas é já em tom de desespero, que o senso comum tem em relação aos políticos, que dizem uma coisa em campanha e fazem outra. Se assim for, Trump pode ainda ter as tais notas positivas.


Aguardaremos aquilo que será a sua presidência. 

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